O primeiro valor para todas as pessoas é o direito à vida. Se esse direito não está assegurado, de nada vale o resto.
No
Brasil de hoje vivemos as maiores transformações sociais da nossa
história, em que as condições básicas de vida para toda a população
estão asseguradas. No entanto, as condições de segurança para toda a
sociedade - especialmente o direito à vida - hoje são negadas a um
numero cada vez maior de pessoas, particularmente jovens e de origem
negra.
O
genocídio de jovens negros é o maior escândalo do Brasil de hoje. As
famílias desses jovens melhorou inegavelmente de vida na última década,
mas se elevou em quase 200% o genocídio de jovens negros, nesses mesmos
anos.
Como
correlato desse genocídio, o Brasil possui a polícia mais violenta do
mundo. Esses fenômenos são possíveis, porque foi fabricada na opinião
publica a criminalização das crianças e jovens negros. De crianças e
jovens das famílias pobres de nossa sociedade, que deveriam merecer
nossa atenção, nosso cuidado, nosso apoio, passaram a ser sinais de
risco, de perigo para a segurança dos outros.
Enquanto
essas crianças e jovens são vítimas de mais de 1/3 dos crimes cometidos
no Brasil – na sua grande maioria pela polícia -, eles são responsáveis
por menos de 2% dos crimes cometidos. No entanto se fabricou
diabolicamente na cabeça das pessoas a imagem de que essas crianças e
jovens são responsáveis pelo aumento dos problemas de segurança na nossa
sociedade e não vítimas da insegurança, o que se presta à cruel
discriminação contra eles.
Construiram-se
assim os clichês que permitem a chacina dos jovens negros, com
autorização e delegação da opinião pública à polícia para o seu
extermínio. Um mecanismo hediondo que faz com que tenhamos a polícia que
mais mata no mundo.
E
isso não se tornou um escândalo na sociedade, porque a situação das
crianças e jovens negros esta invisibilizada na nossa sociedade,
escondida pela mídia. Essas crianças e jovens não são das famílias de
classe média e da burguesia. Os que morrem, os que estão amontoados nas
prisões, não são seus filhos, que não correm o risco de passar por essas
situações. Não apenas não importa a esses setores fundamentais
atualmente para compor a opinião publica o destino dessas crianças e
jovens negros como, ao considera-los risco para eles, delegam, calam,
não olham e, de alguma forma, aprovam, implícita ou explicitamente o seu
genocídio.
No
entanto, mesmo do ponto de vista da sua própria segurança, essas
pessoas nunca terão garantia total da sua segurança enquanto houver na
nossa sociedade pessoas que não tenham assegurada sua vida. Não adianta
colocar grades nas suas casas e nos seus prédios, fechar ruas, contratar
polícias privadas para seus bairros e até mesmo seguranças pessoais.
Não adianta ainda mais câmaras de vigilância, de nada serve autorizar e
incentivar a policia para assassinar essas crianças e jovens.
Se
não houver segurança para todos, garantia de vida, de integridade
física, direito de ir e vir, direito de viver, acabaremos em uma
sociedade de guerra de todos contra todos, do olho por olho, dente por
dente uma sociedade do ódio e da intolerância, da violência desenfreada,
como já há em alguns lugares do mundo e inevitavelmente vai acabar
chegando aqui também.
Além
de que não podemos tolerar, financiar, delegar a uma policia que mata
nossas crianças e jovens impunemente. Não pode agir em nosso nome. Basta
que visibilizemos essa situação, para que ela se torne insuportável
para os que mantém ainda um mínimo de humanidade. Por isso a mídia
esconde, criminaliza essas crianças e jovens, condição prévia
indispensável para que sejam exterminados. Só porque são desumanizados,
projetados na cabeça das pessoas como gente capaz de cometer crimes
hediondos, é que em seguida podem ser vítimas dos genocídios cotidianos.
Três
ou quatro ou mesmo dez dessas crianças e adolescentes negros são mortos
diariamente pela polícia. Estamos de que lado? Dessas crianças e jovens
negros ou da polícia?
Na
verdade não deveríamos ter que escolher lado, embora devemos estar do
lado das crianças e jovens negros. Deveríamos desativar esses mecanismos
cruéis, pelos quais terminamos sendo os autores intelectuais desse
genocídio, que a polícia comete em nosso nome, paga com os nossos
impostos, usando o uniforme do Estado brasileiro, agindo supostamente
para nos defender do perigo.
Desativar
esses mecanismos macabros supõe reconquistar a opinião pública para uma
visão de paz e de convivência entre as pessoas. Devemos fazer um grande
mutirão nacional contra a violência, contra a ação brutal da polícia
contra os jovens negros no Brasil de hoje.
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