domingo, 24 de outubro de 2010

Freud no Mundo de Sofia 1

Como introdução aos estudos de Freud e psicanálise, utilizaremos um capítulo do livro “O Mundo de Sofia”, de Jostein Gaarder, Tradução de: Catarina Belo. Editorial Presença.

Vou falar-te de Freud e da sua teoria sobre o inconsciente.

Sentaram-se em frente à janela. Sofia olhou para o relógio e disse:

- Já são duas e meia, e ainda tenho que fazer muita coisa para a festa do jardim.

- Eu também. Vamos falar rapidamente sobre Sigmund Freud.

- Era um filósofo?

- Podemos defini-lo como um filósofo da cultura. Freud nasceu em 1856 e estudou medicina na universidade de Viena, cidade em que passou a maior parte da sua vida, justamente no período em que a vida cultural de Viena estava no apogeu. Especializou-se no ramo da medicina que se chama neurologia. Em finais do século passado - e durante a primeira metade deste século - elaborou a sua “psicologia analítica” ou “psicanálise”.

- Espero que expliques isso melhor.

-Por psicanálise entendemos quer uma descrição da psicologia humana em geral quer um método para a cura das doenças nervosas e psíquicas. Não tenho intenção de te fornecer um quadro completo nem de Freud nem da sua atividade, mas a sua doutrina do inconsciente é fundamental para compreendermos o que é um ser humano.

- Já conseguiste despertar o meu interesse. Fala!

- Segundo Freud, existe sempre uma tensão entre um ser humano e o ambiente que o rodeia. Mais precisamente, trata-se de uma tensão, ou de um conflito, entre as pulsões e necessidades do homem e as exigências do mundo externo. Não é exagerado afirmar que foi Freud a descobrir a vida instintiva do homem, e isto torna-o um expoente das correntes naturalistas, dominantes no final do século.

- O que queres dizer com "vida instintiva" do homem?

- Nem sempre a razão domina as nossas ações: o homem não é apenas um ser racional como os racionalistas do século XVIII pensavam. Muitas vezes, são os impulsos irracionais que determinam o que pensamos, o que sonhamos e fazemos. Estes impulsos irracionais podem ser expressão de pulsões profundas ou de necessidades. Tão importante como a necessidade de sucção do recém-nascido é o impulso sexual do homem.

- Compreendo.

- Em si, talvez não fosse uma verdadeira descoberta, mas Freud mostrou que as necessidades deste gênero podem ser "camufladas" ou "transformadas" e dominar assim as nossas ações sem que tenhamos consciência disso.

Mostrou ainda que mesmo as crianças têm a sua forma de sexualidade. Esta constatação da sexualidade infantil provocou na burguesia culta vienense uma reação de repulsa que tornou Freud muito impopular.

- Não é de admirar.

- Estamos a falar da chamada época vitoriana, quando tudo o que tinha a ver com a sexualidade era considerado tabu. Freud tinha chegado às suas conclusões sobre a sexualidade infantil através da sua prática como psicoterapeuta, logo, as suas afirmações tinham um fundamento empírico.

Ele tinha também verificado que muitas formas de doenças psíquicas podiam ser reconduzidas a conflitos na instância. Gradualmente, desenvolveu um método de cura que podemos definir como uma espécie de "arqueologia psíquica".

- O que queres dizer com isso?

- Um arqueólogo procura encontrar vestígios de um passado longínquo escavando os diversos estratos culturais: encontra uma faca do século XVII, um pouco mais abaixo descobre um pente do século XIV e ainda mais abaixo um vaso do século IV.

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